Caminante,
son tus huellas
el camino, y nada más;
caminante, no hay camino,
se hace camino
al andar,
Disse Machado, em versos cujo eco das
repetições jamais lhes tirou
a beleza seminal. Mas, António, há no caminho
escolhas e dramas,
você sabia disso, afinal escreveu, rasgo de desesperança, no
início
daquele mesmo poema, numa parte eclipsada pelo ruído da fama:
Nunca
perseguí la gloria
ni dejar en la memória
de los hombres mi canción,
entre
tantas trilhas que nos envolvem
(Os homens mutilam versos e tristemente os traem). A
trilha era áspera,
eu sabia, adivinhei os passos que faço e refaço,
seriam difíceis, sangue
estancado no silêncio sem eco dos olhos secos, a
angústia da diáspora
que semeia nas palavras solidão e tédio, matéria prima do
todo poema.
Nada trouxe comigo, só algumas poucas palavras e versos de homens
e
mulheres mortos, e é com essas pedras que tento esculpir o espectro
daqueles
que um dia chamei de “homens possíveis”, única esperança.
Caminhamos tecendo
solilóquios nas sombras do silêncio que consome.
Silêncio e solidão o que
colhemos, são esses os frutos podres e perversos
deste caminho - Lasciate ogne speranza, voi ch'intrate - que escolhemos.
Na tentativa de roubar um
fogo antigo, encontramos a solidão do poema
que se nos conforta, apavora as violentas
volutas da vertigem dos versos.
E quanto mais caminho na direção do fogo
buscando a poesia, mais lodo,
lama encontro, se me alimento, é apenas do pão
imaginário das palavras
dos mortos, seus sons e formas, sua possibilidade.
Ninguém veio comigo
mas são tantos virgílios a meu lado que sei que não
conhecerei a todos.
Quanto mais me embrenho no rumo das chamas, maior o peso
da solidão
e do silêncio.Trago comigo poucas palavras, as dos mortos e as
minhas,
são as que na pressa pude carregar no alforje da minha fuga, o raro pão
com
o qual me alimento, na esperança de um dia, enfim, tornar-me surdo.
Há aqui
demais silêncio e solidão, mas não suportava as gralhas, não nego,
e o vagido
das vaidades, não suportava disputar por um cenário sem plateia,
e aplausos
feitos de ecos e egos. Agarro-me a tantas pedras sem paisagem,
fuga em chamas,
que rasgo minhas vísceras, que alimentam carcarás cegos.
Nesta trilha traço
meu rumo de solidão, silêncio e palavra, só deles preciso
para desenhar
descalço as pegadas que abandono, e envolvem como heras
o caminho na direção,
senão do fogo, da minha morte, quando, sob pedras,
pedra a pedra construirei
com as palavras que salvei um poema improvável.
O caminho está feito, António,
sei que não há retorno possível, levo comigo
filho, mulher, palavras e livros,
e algumas poucas frases de circunstância
vitais para o uso cotidiano, pois os
que me vêm, cegos, me pensam aqui.
O triste espetáculo ainda continua, vejo nos
horizontes inúteis da distância.
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Tiziano |
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