O
aprendizado da pele e DA COR
Olhar
um filho é pressupor-se sépia.
É
olhar-se homem, masculino precário,
com
esse olho imaterial e primeiro
do
aprendizado permanente da pele
e pele permanecerá
Temos,
os homens, um ventre
transcendente,
dois seios secos e cegos
que
se dissolvem, estelar e láctea ilusão:
nosso
leite invejoso de mamífero incompleto,
que somos.
Para
nós, o universo e o umbigo se expandem
na
exata medida em que as peles se estreitam.
CAPITU DECAPITADA
“Era de uma feiúra que não passaria despercebida a
ninguém (...). Era feiúra e não cabia descrevê-la como nada mais. Era um dom do
céu, uma perfeita feiúra, negada à maior parte das mulheres.
Mas Kinué se sentia constantemente angustiada por
sua beleza”
Yukio Mishima – A Corrupção de um Anjo

Ela era feia, muito feia, feia demais...
uma feiura tão
absoluta que o mundo
estancava sem
desejos e sem ilusões.
Feia, e por feia
demais inventava espelhos
Ele era ruim,
muito ruim, seu verso roçava,
não o ritmo das
águas, mas o silêncio roto
da boçalidade. Seu
lugar comum, nem era
comum, mas terra
arrasada pela multidão
Era feia, sua
virilha negava o caminho, trilha
de cactos flácidos,
sua nudez o prenúncio do fim
da humanidade. Mas
na foto, como ela brilhava!
Fazia-se trilha de
desejos ao aconchego de Vênus
Era ruim, e embora
avaras as palavras, vertia
versos em profusão
poluída, sobravam silêncios
e mentira, nada
tinha a dizer. Mas naquela tela
branca e fugaz,
tudo podia ressoar, dizer e sumir.
Seus seios secos e
sedentos de subsolos
e a terra arrasada
da fonte baça de seus olhos
eram desertos e
areia, mas na tela brilhavam
olhos e seios de
desejos milenares e de ressaca
Com orgulho
escondido (e raiva) ele escrevia:
“gosto de olhos
que sorriem, gestos que se desculpem”
E assassinava em
baixo: Machado de Assis!
Que despencava seu
gume sobre a jugular do Bruxo
Um luxo este tempo
de mentira e mediocridade
tempo de
esquizofrenia. E assim ele escrevia
legitimando-se; ela
sorria, linda, sua face no face,
que faceira! Que
feitiçaria!.. Era toda sedução
Tempo de bytes e biltres
efêmeros e falsos, ela
ele, tudo tão
falso quanto essas faces no Face,
those falling
faces que abismam sem alma,
no chão do espaço,
no vácuo ao pé da tela
DESPERTA, Ó Mundo
Sigmundo!
Muito bom dia,
senhor! Treme a manhã.
Ela me cumprimenta,
entre grave e cínica.
Com medo? Numa voz
rouca e lasciva:
Acontece... Permita-me
apresentar-me,
sou uma Hippopotamidae, ela saliva
(Os gregos me conheciam por Ιπποπόταμος,
algo como άλογο "cavalo" (prefiro égua)
e Ποταμός, "rio" (amor, me chame água).
Meu nome? Hippopotamus amphibius,
tão difícil... pode me chamar de "Hipa".
Para os egípcios, eu era uma deusa, eles rezavam
para Tuéris, divindade fértil, uma hipopótama,
claro, como eu, bípede. Sábios aqueles egípcios...
Ela, mais e mais insinuante, quase sereia, servia
aquele abismo de desejos reprimidos. E pesados.
(Os gregos me conheciam por Ιπποπόταμος,
algo como άλογο "cavalo" (prefiro égua)
e Ποταμός, "rio" (amor, me chame água).
Meu nome? Hippopotamus amphibius,
tão difícil... pode me chamar de "Hipa".
Para os egípcios, eu era uma deusa, eles rezavam
para Tuéris, divindade fértil, uma hipopótama,
claro, como eu, bípede. Sábios aqueles egípcios...
Ela, mais e mais insinuante, quase sereia, servia
aquele abismo de desejos reprimidos. E pesados.
o focinho feito de fino cristal perigava estalar,
como vê, ela arde, sou um pouco diferente
de meus parentes. Tentei sorrir num esgar,
fraco, tive medo que, cacos, se partisse em mil.
Tenho as patas e a boca de vidro, assim,
você pode ver o que mastigo. Mas cuidado,
tenho a mordida mais forte que a de um leão.
Olhe minha língua! Lambia-se de tesão, o medo
estraçalhou nas estrelas um resto de vácuo viril.
Se abro minha boca (quase cantava), não é sono,
apenas antecipo a força dos dentes que o espreitam.
O dia? O dia alvo nos meus dentes o desperta
mas tenho fome. De que me alimento? Ora, de cérebros
de angustiados, suicidas, poetas e de outros insensatos.
Mas tenho, querido, que lhe contar um segredo
(hipopótamos se despem? Sei que vi uma nudez
pesada, desesperadamente nua e pesada): na verdade,
somos quase parentes: você, um homo sapiens que sonha,
e eu, uma femina inconscius que persegue seu sonho,
Sua sombra e seu sonho... Súbito ela abre as cortinas
do dia, gargalha e chafurda em meus suores seu riso
eco que se espalha e espelha, descortinando desastres
corpos dilacerados, cabeças, lágrimas maternas em ruínas,
enquanto ela, mais bovina que equina, ri de mim, e rumina.
Há manhãs em que o
sol nasce tão doce, que acordamos
e vivemos uma vida leve e levianamente cor de rosa...
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