O ANTIFAUSTO
Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida
descontente,
Repousa lá no Céu
eternamente
E viva eu cá na terra
sempre triste.
Luís
de Camões
Um dia quiseram comprar minha alma,
dinheiros, mulheres, viados de gravata,
poder me ofereceram, neguei, orgulhoso
da eternidade garantida ao espírito no éter
Hoje, que não creio no eterno, quis leiloá-la
no Sotheby’s, talvez um rico colecionador
de almas a quisesse, trouxe do pregão
senão desprezo. Tentei o Marché au Pieces
Depois a Praça XV, tudo na esperança
de um brechó de almas. Encontrei um,
meu espírito era velho, ainda não antigo,
nenhum preço, mesmo na bacia das almas.
Um caixote na Central do Brasil! A multidão,
sem ver minha alma, corria, ela não valia
o vento de um pastel pingando óleo cárter.
Desesperado, a ofereci a Mefisto, ouço
ainda a gargalhada: “quis tua alma, poeta,
orgulhoso e vil, negaste meu preço e apreço,
humilhado, voltei sem alma à solidão do Ades
Hoje, poeta, tua alma vale menos que o corpo,
que, aliás, envelhece, duas facas enferrujadas”.
Meio a uma explosão, desapareceu de chofre
deixando no ar um rastro de solidão e enxofre.
Alma minha gentil, quando eu partir,
levo-te comigo e tua tristeza, por toda eternidade.
ESTRIDENCIAS
O
sol se insinua e ensina seus silêncios
e
já aflora lá fora a estridência dos gritos
a
irridencia irritante das TVs tão cedo ligadas
o
surdo monólogo dos que se creem diálogo
Tento
falar, há em minha volta um vidro
espesso,
tropeço em verbos feitos cacos.
Sempre
assim, mal a palavra faz-se voo,
dolorosamente
quebra-se no ar. Gritar?
Em
todas montanhas há um eco ao avesso
leva
os sons e perde-os no vácuo, no vento
e
o verso estanca. Há séculos tive um ouvinte
de
velho cansou-se deste tempo de surdos.
Desde
então me calei,
quando eu for silêncio talvez me escutem
quando eu for silêncio talvez me escutem
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